segunda-feira, 14 de maio de 2012

Desigualdades de gênero e raça no Brasil

No rastro das comemorações do Dia Internacional da Mulher, ocorrido há poucos dias, mergulhar no complexo universo da realidade feminina é um dos caminhos para entender as profundas diferenças sócio-econômicas provocadas pela desigualdade racial e de gênero nos quatro cantos do mundo.

Fatos históricos pontuam há séculos elementos sobre a perversidade das desigualdades entre os sexos. O Dia Internacional da Mulher, por exemplo -criado em 1945 pelas Nações Unidas -, nasceu no bojo da luta pela igualdade de direitos entre homens e mulheres do planeta. A data foi sugerida em razão de uma marcha histórica ocorrida quase um século antes, em 8 de março de 1857. Centenas de mulheres operárias (judias e italianas imigrantes) tomaram as ruas de Nova Iorque (EUA) contra os baixos salários e as péssimas condições de trabalho. Um incêndio criminoso teria causado a morte de cerca de 130 manifestantes.

Nos últimos 150 anos, muita coisa mudou na luta pelo tratamento igualitário dos direitos da mulher. Para a mulher negra brasileira, a principal delas ocorreu quando um grupo de mulheres negras (entre elas a socióloga, feminista e ativista política Lélia Gonzales) trouxe - tanto para o Movimento Negro quanto para o Movimento Feminista - o debate sobre o olhar diferenciado em relação à realidade da mulher afrodescendente no Brasil. Hoje, já são mais de 100 entidades de mulheres negras comprometidas na luta pela igualdade de direitos e com a erradicação das desigualdades raciais no País.

Dados estatísticos recentes comprovam que o preconceito sustenta uma dupla opressão para a mulher negra no Brasil e cria realidades diferenciadas entre negras e não-negras. Estudo recente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) mostra um dos traços cruéis deste tratamento diferencial. Segundo o Ipea, a mão de obra feminina negra recebe o equivalente a 60% do salário de um homem branco para ocupar o mesmo cargo. De acordo com projeções do pesquisador Sergei Soares, do Ipea, em 30 anos o problema da desigualdade de salários entre os sexos estará resolvido no País. As desigualdades raciais, entretanto, permanecerão idênticas, caso o Estado não adote políticas públicas corretivas.

Levantamento realizado pela Articulação de Mulheres Brasileiras, sob o título Mulheres Negras - Um retrato da discriminação racial no Brasil, lançado em 2001 no bojo da Conferência Mundial contra o Racismo, em Durban, também fornece informações contudentes que chamam atenção para as disputas desiguais enfrentadas pela mulher negra no dia a dia.

De acordo com o estudo, somos 169, 5 milhões de brasileiros, dos quais 50,79% são do sexo feminino. Deste percentual, 44% são mulheres negras e pardas. Os números - ainda que significativos -não garantem acesso igual aos serviços básicos oferecidos aos cidadãos. Na educação, por exemplo, as disparidades nas taxas de alfabetização e escolaridade entre mulheres negras e brancas é preocupante: 90% e 83% para as brancas e 78% e 76% para as negras, respectivamente.

O desequilíbrio, segundo o levantamento, traz consequências diretas nos índices de desemprego. A população negra - sobretudo as mulheres - sofre tratamento discriminatório na hora de procurar trabalho. Para a mulher negra, o tratamento desigual tem um sabor ainda mais amargo, pois 60% das famílias chefiadas por mulheres afrodescendentes têm renda inferior a um salário mínimo.

O estudo aponta ainda que a mulher negra recebe tratamento diferencial na área da saúde. Entre 1993-1998, por exemplo, uma pesquisa no Paraná denunciava que o risco relativo de mortes maternas de mulheres afrodescendentes é 7,4 vezes maior do que as não-negras. Outro índice mostra que, no Brasil, a mulher negra têm 25% a menos de chance de alcançar os 75 anos em relação às mulheres brancas.

A sociedade brasileira está iniciando o processo de transformação. Hoje, organizações não governamentais, movimentos sociais e alguns setores do governo federal têm realizado um esforço conjunto para discutir as ferramentas potencializadoras para a errradicação dos males do racismo. Debates, publicações e até polêmicas sobre a implementação de políticas públicas vêm pautando a sociedade brasileira no processo pós-Durban (local onde foi realizada a Conferência Mundial contra o Racismo). O Ibase, ao lado do Centro de estudos Afro Brasileiros (Universidade Cândido Mendes), Criola, Geledés, entre outras Ongs, vêm realizado importantes debates sobre essa questão.

Entre julho de 2001 e setembro do ano passado, por exemplo, o Ibase promoveu três reuniões dos Diálogos sobre a Conferência Mundial contra o Racismo. Os encontros, que reuniram cerca de 65 Ongs do Brasil inteiro, resultaram na publicação Sonhar o futuro, mudar o presente - Diálogos contra o racismo, por uma estratégia de inclusão racial no Brasil. Entre as propostas, o grupo sugere o rompimento do silêncio e a necessidade de ampliação do diálogo "para atrair aqueles que o diálogo pode influenciar e, de outro lado, aqueles que têm que influenciar o diálogo?. Mulheres, falemos.

Fonte: 
http://www.midiaindependente.org/pt/blue/2003/03/250042.shtml

Postado por: Glória Neuza Vieira de Jesus

Nenhum comentário:

Postar um comentário